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  • Marlene Busko

Comer ou não comer ovos? Eis a questão no diabetes


Entre os pacientes com sobrepeso ou obesos com diabetes tipo 2, aqueles que comeram 12 ovos por semana ou mais (dieta rica em ovos) tiveram níveis de pressão arterial e marcadores de doença cardiovascular semelhantes à aqueles que comiam menos que dois ovos por semana (dieta pobre em ovos) em um ano de estudo.

“Estes achados sugerem que é seguro para pessoas com alto risco de diabetes tipo 2 e aquelas com a doença incluir ovos na dieta alimentar regular, uma fonte alimentar aceitável e conveniente”, concluem os pesquisadores do estudo.

Estes resultados são do estudo Diabetes and Egg (DIABEGG) realizado pelo pesquisador Nicholas R. Fuller e colegas, do Boden Institute of Obesity, Nutrition, Exercise and Eating Disorders da University of Sydney (Austrália). O estudo foi publicado on-line em 7 de Maio no American Journal of Clinical Nutrition.

Jyrki K. Virtanem, PhD e professor-adjunto de epidemiologia nutricional na University of Eastern Finland, em Kuopio (Finlândia) foi convidado a comentar o trabalho. Ele não esteve envolvido com o estudo, mas disse concordar com os resultados.

Este estudo não significa concluir que “pessoas com diabetes (ou qualquer outra pessoa) não devam se preocupar quanto aos próprios níveis de colesterol, ele apenas mostra que uma ingestão maior de ovos (portanto, também de colesterol) não teve impacto ruim nos níveis de colesterol da população do estudo”, disse ele ao Medscape por e-mail.

Em geral, uma dieta com colesterol tem um impacto pequeno nos níveis séricos de colesterol da maioria das pessoas, explicou Virtanen, acrescentando que a qualidade da gordura na dieta, por exemplo, tem um impacto maior.

A mensagem para se guardar do estudo, de acordo com Virtanen, é “tudo bem incluir ovos na dieta, mesmo que você tenha diabetes tipo 2. Muitas pessoas gostam de comer ovos e os ovos são usados em muitas receitas e pratos, então se não há uma restrição severa aos ovos, isto pode facilitar a vida.”

O número ideal de consumo de ovos por semana depende da genética, da saúde geral, e de uma dieta alimentar completa, disse ele. De acordo com a maioria das pesquisas, “um ovo por dia pode ser adequado para a maioria das pessoas, no entanto, como no estudo atual, até mesmo um consumo maior pode ser adequado.”

Ele ainda acrescentou que “se pensarmos sobre o impacto ambiental da comida (como deveríamos pensar), os ovos têm um dos menores impactos na emissão de gases do efeito-estufa entre as proteínas animais.”

Contudo, outro especialista que tem criticado muito o mercado de ovos disse ao Medscape que este tipo de pesquisa é “propoganda” da indústria de ovos.

Em resposta por e-mail, o Dr. J. David Spence, professor de neurologia e farmacologia clínica da Western University, e pesquisador do Stroke Prevention & Atherosclerosis Research Centre, em London (Canadá), não quis comentar sobre este estudo.

Mas ele reiterou sua crença em que não existe uma quantidade segura de gemas de ovos para pessoas com diabetes, ou com risco para doença cardiovascular. Ele disse, no entanto, que não vê problemas no consumo de claras de ovos.

Achados e diretrizes conflitantes

Como previamente reportado, Fuller e colegas apresentaram os dados parciais do estudo DIABEGG como pôster no congresso de 2014 da European Association for the Study of Diabetes.

Eles conduziram a pesquisa por causa de dados conflitantes e diferenças entre as diretrizes nacionais sobre o consumo de ovos por diabéticos.

Em estudos epidemiológicos, nas pessoas com diabetes tipo 2 (mas não a população geral), por exemplo, o maior consumo de ovos associou-se com maior risco para doença cardiovascular (DCV) e mortalidade precoce, escrevem Fuller e colegas.

Mas estudos controlados em pessoas com pré-diabetes ou diabetes tipo 2 têm mostrado efeitos predominante favoráveis de um consumo alto em ovos quanto aos fatores de risco metabólicos e cardiovasculares.

Para adicionar à confusão, diferentes países e diferentes sociedades têm distintas recomendações. Por exemplo, em pessoas com diabetes tipo 2, a British Heart Foundation e a Diabetes UK (Reino Unido) não recomendam limitar o consumo de ovo ou colesterol, mas a National Heart Foundation da Austrália recomenda o máximo de seis ovos por semana.

A American Diabetes Association recomendava limitar o consumo de colesterol em 300 mg/dia (um ovo contém cerca de 200 mg de colesterol), mas recentemente eles removeram este limite.

DIABEGG: sem efeitos adversos nos marcadores DCV

No estudo DIABEGG, 128 adultos com 18 anos ou mais e com diabetes tipo 2 ou pré-diabetes e índice de massa corporal (IMC) de pelo menos 25 kg/m2foram randomizados para perda peso e alimentação saudável com consumo baixo ou alto de ovos.

A alimentação enfatizava trocar o consumo de gorduras saturadas (como manteiga) por gorduras mono ou poliinssaturadas (como abacate e azeite de oliva).

Os pacientes tinham em média 60 anos e tinham média de IMC de 34 kg/m2. Cerca de três quartos tinham diabetes tipo 2 e 54% eram mulheres.

O valor médio basal do colesterol HDL (como desfecho primário) foi de 1,3 mmol/L (aproximadamente 50 mg/dL) e mais que a metade (58%) estava em uso de hipolipemiante oral.

Por três meses de período de adaptação, os pacientes foram instruídos a manter um peso estável. Aqueles do grupo de alto consumo de ovos foram instruídos a comer dois ovos/dia no café da manhã, enquanto o grupo de baixo consumo de ovos foi instruído a comer menos de dois ovos/semana, e igualar a ingestão de proteínas com a quantidade do grupo de alto consumo de ovos, acrescentando ao café da manhã 10 g de proteína animal magra (carne vermelha, frango, ou peixes) ou outras fontes alternativas ricas em proteínas, como legumes e laticínios com baixo teor de gordura.

Os ovos podiam ser cozidos ou poché, mas também podiam ser fritos se fosse usado para a fritura um óleo de cozinha poliinsaturado, como o azeite.

Os participantes recebiam ovos ou vale-compras e eram encorajados a aumentar o número de passos para 10.000 por dia.

Depois deste período de adaptação os participantes entraram na fase de perda de peso ativa por três meses, durante a qual passavam por uma consulta com nutricionista uma vez ao mês. Eles então entraram na fase de seguimento por seis meses, e foram aconselhados a continuar comendo o mesmo número de ovos.

Os participantes respeitaram as quantidades de ovos a serem consumidos: aos seis e 12 meses, aqueles do grupo de alto consumo de ovos reportaram um consumo médio de 12,2 a 10,5 ovos/semana, enquanto aqueles do grupo de baixo consumo de ovos reportaram um consumo de 1 a 1,1 ovos/semana, respectivamente.

Pacientes de ambos grupos perderam aproximadamente 2 kg ao final dos três meses da fase de perda de peso ativa, e mais 1 kg durante os seis meses seguintes.

Dos três aos 12 meses, os participantes dos dois grupos apresentaram mudanças semelhantes nos níveis lipídicos (colesterol HDL, LDL, colesterol total e apo-lipoproteína B), marcadores inflamatórios (proteína C-reativa, interleucina 6 e selectina E solúvel), marcadores de estresse oxidativo (F2-isoprostanos) e marcadores de glicemia (glicose, hemoglobina glicada, adiponectina e 1,5-anidroglucitol).

Propaganda da indústria de ovos?

“Este foco nos níveis lipídicos de jejum e nos marcadores sanguíneos é uma clássica cortina de fumaça – um dos pilares da propaganda da indústria de ovos”, disse o Dr. Spence.

Em vez disso, o que é importante é que “ovos aumentam risco de diabetes e, em pessoas com diabetes, eles aumentam o risco de ataques cardíacos”, disse ele, ressaltando que a gema do ovo é uma das mais concentradas fontes de colesterol.

Como parte do próprio argumento, ele cita um estudo grego em que um ovo ao dia associou-se com cinco vezes mais risco de doença coronária em pacientes com diabetes (J Intern Med. 2006;259:583-591).

O Dr. Spence ainda acrescentou que é muito mais difícil mostrar o prejuízo dos ovos na dieta dos EUA porque “somente 0,1% dos americanos comem uma dieta saudável.”

Virtanem disse que “é verdade que um maior consumo de ovos tem sido associado com maior risco de diabetes na população geral, e com maior risco de DCV em pessoas com diabetes em alguns estudos epidemiológicos”, como Fuller e colegas descrevem no artigo.

Mas em uma meta-análise de dose-resposta de estudos de coortes prospectivas em que Virtanen foi co-autor (Br J Nutr. 2016;115:2212-2218), “o maior risco de diabetes foi visto principalmente em estudos epidemiológicos nos Estados Unidos e não em outros países”, disse Virtanen.

Ele acrescentou que, nos Estados Unidos, o maior consumo de ovos foi associado com mais tabagismo, menor nível de atividade física, e maior consumo de carne vermelha processada, o que pode, em parte, explicar os resultados.

No estudo prospectivo, populacional: Ischaemic Heart Disease Risk Factor(KIHD) publicado (Am J Clin Nutr. 2015;101:1088-1096), do qual Virtanen foi o primeiro autor, um consumo maior de ovos foi associado com menor risco de diabetes de início recente na população de adultos de meia-idade e homens idosos na Finlândia.

“Enquanto os ovos por si só são uma fonte alimentar rica em colesterol – e as pessoas com diabetes tipo 2 tendem a ter níveis elevados de “mau” colesterol, lipoproteína de baixa-densidade (LDL) colesterol – este estudo atual apoia pesquisas que mostram que o consumo de ovos tem pouco efeito no nível de colesterol no sangue das pessoas que os comem”, disse Fuller em uma declaração da University of Sydney.

Gemas: cadeia bioquímica leva ao endurecimento de artérias

O Dr. Spence explicou o processo bioquímico que ele acredita contribuir para efeitos adversos dos ovos em pacientes com diabetes.

“As gemas dos ovos são ricas em fosfatidilcolina que é convertida, pelas bactérias intestinais, em trimetilamina, que é então oxidada no fígado em óxido de trimetilamina-N (TMAO), e o TMAO é ruim para as artérias”, afirma ele.

“O TMAO também é um produto da carnitina nas carnes (quatro vezes mais do que nos frangos), então as gemas de ovos e as carnes vermelhas são um golpe duplo. Estes alimentos não deveriam ser consumidos por pacientes com risco de ataque cardíaco e acidente vascular cerebral (AVC) – o que inclui as pessoas com diabetes.”

Embora Virtanen concorde que “a fosfatidilcolina nos ovos seja uma das maiores fontes de produção de TMAO no corpo”, ele enfatiza que há uma ampla variedade de formação de TMAO após a ingestão de ovos entre as pessoas, então muitos estudos têm observado um aumento de TMAO no maior consumo de ovos e outros estudos não.

“Poderia ser interessante avaliar os efeitos das concentrações de TMAO no estudo DIABEGG”, disse ele.

O Dr. Spence mantém a opinião de que “comer gemas de ovos não é recomendado” para pessoas com diabetes ou pré-diabetes.

“Recomendo aos meus pacientes que eles usem claras de ovos, ou que, pode ser até mais agradável, substitutos à base de claras de ovos”, disse ele ao Medscape.

Fuller: “Comer ovos como parte de uma dieta saudável é OK”

No entanto, Fuller argumenta que “apesar de conselhos diferentes sobre níveis seguros de consumo de ovos para pessoas com pré-diabetes e diabetes tipo 2, nossa pesquisa indica que as pessoas não precisam evitar ovos se isso fizer parte de uma dieta saudável”.

Além disso, “os ovos são uma fonte de proteínas e micronutrientes que podem apoiar uma série de fatores de saúde e dietéticos, incluindo a regulação da ingestão de gordura e carboidratos, a saúde ocular e cardiovascular, vasos sanguíneos saudáveis e gestações saudáveis”, conclui ele.

O estudo foi financiado pela Australian Egg Corporation, que não teve nenhum papel no estudo ou artigo. Fuller recebeu bolsas de pesquisa para outros ensaios clínicos de Sanofi-Aventis, Novo Nordisk, Allergan, Roche, MSD e GlaxoSmithKline. As declarações de conflitos de interesses dos outros autores estão listadas no artigo. Virtanen e o Dr. Spence declararam não possuir conflitos de interesses.

Am J Clin Nutr. Publicado on-line em 7 de maio de 2018.

Medscape

Citar este artigo: Comer ou não comer ovos? Eis a questão no diabetes - Medscape - 8 de junho de 2018.

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